terça-feira, 3 de março de 2009

Quem não inova, se trumbica

O crescimento da China não impressiona só na economia. O número de artigos científicos com pelo menos um autor chinês cresceu de 828, em 1990, para mais de 80 mil em 2007, segundo um artigo de Nora Bar no jornal argentino La Nación de 25 de fevereiro. A China é hoje o segundo país com mais trabalhos em nanotecnologia, atrás apenas dos Estados Unidos. E, em 2014, deverá, se as coisas continuarem como estão, tornar-se a primeira do mundo em registros de patentes (que são produtos de inovação tecnológica, por sua vez resultado de pesquisa científica), ultrapassando os EUA – segundo outro artigo, de Leonardo Senna, no Jornal do Brasil de hoje.

O artigo de Nora Bar fala sobre o crescimento da ciência em países emergentes e cita ainda a Índia e o Brasil. Ainda falta muito para essas nações chegarem no patamar dos países mais desenvolvidos – só os Estados Unidos detêm nada menos que 31,3%, quase um terço, da produção científica e tecnológica mundial, segundo um texto de Celso Lafer (presidente da Fapesp, Fundação para o Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo) publicado na Folha de S. Paulo em 18 de janeiro. A China participa com 6,3%. Isto parece pequeno em comparação com os EUA, mas a percepção se inverte quando se vermos a cifra do segundo lugar, o Reino Unido: “apenas” 8,7%.

Os números do Brasil são mais modestos que os da China – nossa produção científica e tecnológica, segundo o texto de Lafer, é de 1,72% da mundial –, mas, mesmo assim, ela vem crescendo muito (o mesmo texto diz que a produção científica indexada brasileira aumentou 22,7% entre 2003 e 2006). Porém, aqui existem alguns fatores que relativizam muito esse vigor. Um deles é a enorme concentração no Estado de São Paulo. Segundo Lafer, 51% da produção do conhecimento científico-tecnológico no Brasil vem de lá.


Inova, empresa!

Mas o mais importante é o número de patentes registradas pelo Brasil (um parâmetro que reflete o quanto as pesquisas científicas estão se convertendo em inovações tecnológicas). São recorrentes as advertências de vários cientistas de que temos muita ciência, mas as transformamos pouco em patentes (salvo em núcleos isolados – em geral, novamente, no Estado de São Paulo). E que isso acontece porque nossas empresas investem pouco em inovação.

Segundo o artigo de Leonardo Senna – que não é cientista, mas empresário –, as empresas brasileiras “investem em média apenas 0,6% do seu faturamento em pesquisas e desenvolvimento de produtos, segundo estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).” As da França e da Alemanha investem 2,6%. A pequena Coréia do Sul, com pouco mais que um quarto da população brasileira, é responsável por cinco vezes mais patentes depositadas no sistema mundial de patenteamento (nos EUA) que o Brasil.

Isso se torna preocupante quando se lembra que é a inovação que faz com que os produtos exportados tenham valor agregado, como Senna lembra bem. Valor agregado pode ser considerado como o valor a mais nos produtos devido ao acréscimo de tecnologia envolvida na sua produção. Apesar de mais caro, tende a vender mais (se tudo for bem feito), por causa da melhor qualidade. É assim que os países desenvolvidos ganham dinheiro e é isso que se quer dizer, principalmente, quando se fala que hoje a economia mundial se baseia no conhecimento.

E essa é uma das principais razões do atraso dos países exportadores de commotidies. Se alguém vender leite tirado diretamente da vaca para depois comprar leite pasteurizado em caixinha, terá que vender muito mais leite do que compra para poder equilibrar suas contas, pois terá que pagar também por todo o processo de industrialização (e mais a caixinha). É o drama das chamadas “economias periféricas”, em oposição às “economias industrializadas”.


Assimetrias Brasil-China

Já faz algum tempo que o Brasil não tem mais o perfil clássico de economia periférica desse tipo. Mas eis que a grande parte de nossas exportações para a China são commodities e as nossas importações de lá são, na maioria, de produtos manufaturados (com maior valor agregado – inovação envolvida – do que commodities). Segundo um estudo do IPEA de 2006, 51% da nossa exportação para a China entre 2001 e 2003 foi de produtos básicos (hoje, destacam-se ferro e soja), enquanto 66,8% das nossas importações foram de equipamentos eletrônicos, siderurgia, químicos, indústrias diversas e material elétrico.

Ainda há uma distância grande até os padrões comuns da relação economia periférica-país industrial, mas, caso continue essa enorme diferença na inovação empresarial daqui e da China, é de se temer a aproximação do padrão “vendo leite cru-compro pasteurizado”. E é inadmissível, para dizer o mínimo, comportarmo-nos como economia periférica diante de um país do Terceiro Mundo.

Há alguns dias, escrevi aqui neste blog sobre a cooperação técnica entre Brasil e China na construção e lançamento de satélites, o que levou o Brasil a tornar-se o maior distribuidor de imagens digitais do mundo. Bem, o blog do jornalista Ulisses Capozzoli, no dia 2, comentou a enorme defasagem entre as pesquisas espaciais daqui e de lá. Na madrugada de domingo, uma sonda chinesa atingiu a Lua. Já colocaram astronautas em órbita. A Índia também está muito avançada – apesar de os três programas espaciais terem começado no mesmo ano, em 1961.

Por que essas assimetrias todas? Talvez o tão criticado corte de 18% da verba do Ministério da Ciência e da Tecnologia no Orçamento de 2009, aprovada pelo Congresso Nacional, contenha alguma dica importante sobre suas origens profundas... Aliás, coincidência ou não, o setor espacial será um dos mais atingidos. Segundo uma reportagem da Folha Online, a Agência Espacial Brasileira (AEB) terá 22,55% menos do que o esperado.

Um comentário:

  1. Gostei muito do seu blog, gostaria que vc fosse minha seguidora.
    http://raizes2011.blogspot.com

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